Fonotipia

Vou postar aqui comentários de CDs e DVDs musicais. Luís Antônio Giron

Thursday, June 24, 2004

CDs - Junho

Eu Não sou Cachorro, Não, coletânea, UniversalA seleção de repertório, a cargo do professor Paulo César de Araújo, augor do livro homônimo, traz o melhor da música cafona engajada produzida nos anos de chumbo da repressão e da censura. São 14 preciosidades: Caetano Veloso iniciando, em 1973, seu longo namoro com o gênero, dividindo a cena com Odair José na definitiva “Vou Tirar Você desse Lugar”; Waldick Soriano e a sempre lembrada “Eu não Sou Cachorro Não” e – pasmem – “Você Também é Responsável”, comovente hino à alfabetização que o governo Médici usou como propaganda, mas que tinha um potencial subversivo que só agora pode ser ouvido.


Mad Love, Robi Draco Rosa, Sony Music
O quarto CD solo do produtor e ex-Menudo nascido em Nova York e criado em Porto Rico é uma surpreendente afirmação artística. Eis Robi cantando e tocando os sete instrumentos com 15 faixas de tirar o fôlego, entre rocks e canções povoadas de reflexões sobre vida, morte e amor. Diferentemente de seus últimos trabalhos, inclusive o de produtor dos mega-sucessos de seu companheiro Ricky Martin, Robi Darco Rosa aposta na experimentação com a música de estúdio. Item essencial para quem não tem preconceitos com boa música.





CDS Lançamentos

Raimundo, Raimundo Fagner, 12 CDs Sony Music
Entender o cantor cearense nascido em 1951 sob um perspectiva histórica foi a intenção do compilador dessa lata com 12 volumes, o pesquisador Marcelo Fróes. Ele reciclou as informações dos álguns originais de Fagner e aproveitou para inserir novas informações. A coleção vai de 1975 a 1985, representando o período em que o cantor foi da gravadora CBS, atual Sony. Fagner começou a carreira em 1971 e gravou dois anos depois seu primeiro e mais brilhante LP, Manera, Frufru, Manera. Pena que este não faça parte da lata. O melhor nela são os discos iniciais, como Asa Noturna (1975) – foto - e Beleza (1980), quando o músico pontificava na MPB. Saudáve revisão.


Quarteto Camargo Gurnieri, Ybrazilmusic
O selo paulistano independente surpreende com o lançamento de um pacote clássico, isso no momento em que a música gravada dos chamados grandes mestres vive uma crise sem precedentes, a ponto de seu fim ter sido declarado. Do pacote destaca-se este CD caprichado com o grupo fundado em São Paulo em 2002. O repertório é quase inédito: Quarteto nº 1, de Osvaldo Lacerda, Quarteto nº 2, de Mozart Camargo Guanrieri, e Quarteto nº1, de Heitor Villa-Lobos. São interpretações fortes e renovadoras que só provam o vigor da música clássica no Brasil.

Todos os Pianos, João Carlos Assis Brasil, Biscoito Fino
O pianista faz sua estréia na gravadora que mais tem trabalhado pela música brasileira, a carioca Biscoito Fino. É um álbum primoroso com 13 faixas, nas quais o músico celebra seus antepassados musicais, como os brasileiros Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga, e também o francês Michel Legrand, o americano Cole Porter e o italiano Nino Rota. Homenageia também seu irmão, o saxofonista Victor Assis Brasil, falecido em 1981. Isso não o intimida a compor belas suítes e valsas, onde mostra sua destreza e enorme sensibilidade. O disco reproduz na íntegra o show que Assis Brasil tem feito Brasil afora nos últimos anos.













Fonotipia 1

Nasce uma diva: Virgínia Rodrigues


No início da carreira, há oito anos, a baiana Virgínia Rodrigues podia ser confundida com a cabo-verdiana Cesaria Evora. Afinal, fora descoberta por Caetano Veloso em Salvador e, feito Cesaria, sabia cantar de coração, não por partitura. No entanto, Virgínia tem um estilo próprio e bem mais erudito que Cesaria. Isso pode ser demonstrado no seu último CD, o terceiro da carreira, o excelente Mares Profuundos (Universal). E é o melhor da sua carreira.
Apesar da linda voz de mezzo-soprano, a moça só cantava em corais. Sua profissão era cozinheira. Comovido, Caetano levou-a para sua gravadora, a Natasha Records, e a fez lançar o primeiro CD solo, Sol Negro, em 1997 . O álbum teve repercussão internacional, especialmente nos Estados Unidos, onde jornais como o Teh New York Times a apelidaram de “Cinderela Brasileira”. O segundo CD, Nó, lançado no ano 2000, não repetiu o sucesso. Trazia intervenções eletrônicas e outros modismos. Ainda assim, manteve a reputação da cantora em alta.
Mares Profundos acabou sendo lançado em janeiro nos Estados Unidos, antes da edição brasileira, que aconteceu no final de fevereiro. Como a voz de Virgínia, o produto pode ser definido como erudito, coleção de afro-sambas de Baden Powell (1937-2000) e Vinicius de Moraes (1913-1980).. A coleção da parceria Baden-Vinicius foi concluída em 1966 numa viagem que os dois fizeram a Salvador e se encantaram com a cultura da chamada Roma Negra. O resultado foi sambas magníficos, como “Canto de Ossanha”, “Berimbau” e “Canto de Xangô”.
Virgínia, aos 39 anos, canta com a voz impostada, no padrão clássico. Nisso ela difere de outros intérpretes, que optaram pela vereda da MPB. Acompanhada por arranjos acústicos de boa cepa, Virgínia extrai o caráter profundo da aventura sensual e estética de Vinícius e Baden. É Bahia em sua religião e riqueza cultural. E marca o nascimento de uma diva da canção.

Luís Antônio Giron