Fonotipia

Vou postar aqui comentários de CDs e DVDs musicais. Luís Antônio Giron

Thursday, June 30, 2005

Ao encontro do estilo


De volta a uma grande gravadora, o cantor Pedro Mariano conta como se envolveu na produção de um CD e um DVD ao vivo




Em 1995, Pedro Camargo Mariano cantava pela primeira vez, em um show no Tuca, em São Paulo, em comemoração aos cinqüenta anos de sua mãe, a cantora Elis Regina. Pedro interpretou um sucesso da carreira de Elis, "Ladeira da Preguiça", de Gilberto Gil. Assim, sob a proteção materna, o cantor iniciava a carreira aos 20 anos, desistente da faculdade de Arquitetura. Melhor para música. Dez anos depois, ele volta à faixa inicial e festeja a trajetória lançando seu primeiro CD e DVD ao vivo, quarto título de carreira e quinto CD, contado o projeto Voz e Piano, com o pai, César Camargo Mariano, lançado em 2004. "Ladeira da Preguiça" figura na guia de rótulo dos novos produtos, em arranjo do baterista e pianista Otávio de Moraes, que também assina as outras 16 faixas no CD e as 21 do DVD Ao Vivo (Universal). O trabalho não tem apenas o sentido de comemoração e de seu retorno a uma gravadora multinacional, depois de cinco anos passados na Trama. Pedro Mariano se diz maduro e afirma que finalmente chegou à formulação de seu estilo.
"Estou em condições de assinalar exatamente de onde vim e para onde vou’, diz, entuasiasmado com os novos produtos, depois de seis meses de um trabalho que ele define como ‘enlouquecedro’. "Vim da soul music e do rhythm’n’blues, que ouvi desde pequeno. E conheço a MPB porque ela rolava nos ensaios da sala da minha casa. Sou um pouco de tudo isso, mas algo mais: quero que meu som seja compreendido como uma assinatura." Ninguém sem pergunta, argumenta, sobre o estilo de MIlton Nascimento, Ivan Lins e Djavan. "Todos são MPB, mas cada um no seu estilo. Quero ser entendido assim, não por meio de rótulos".
Pela primeira vez, Pedro se viu envolvido na produção de um DVD. "O sistema 5.1, do DVD, pede uma mixagem totalmente diferente do sistema do CD, o estérero, que chamamos de 2.0", explica. "Assim, o mesmo trabalho ganha duas sonoridades diferentes, no DVD e no CD". Em março deste ano, o cantor e Otávio de Moares já tinham escolhido o repertório e definido os arranjos. O espetáculo foi gravado e filmado nos dias 2 e 3 de abril no Teatro Alfa em São Paulo, conhecido por sua acústica privilegiada. "É tão boa que não acontecem interferências do som do público no do palco, nem de um instrumento em outro." Ele conta que a pós-produção foi mais complicada, por causa do aspecto visual e dos itens extras do DVD, como entrevistas e informações. Uma das novidades do DVD de Pedro será um item com erros. "Sou extremamente autocrítico com minha imagem e com o som", afirma. "Mas isso não impede de eu rir de mim mesmo". As falhas só reforçam o perfecionismo de Pedro. Ele não acha importante exagerar teatralmente no palco, mas evidenciar a sinceridade. "Existe uma verdade no palco que o músico precisa passar para o público. Eu quero mostrar o sentimento com toda a força. Gosto de montar as canções a pêlo".
Ao Vivo é um disco de canções interpretadas na sua integridade. Ambos os produtos evidenciam a filiação de Pedro Mariano à MPB, tanto no DNA propriamente dito como no sonoro. Claro que o jeito com que canta – e na interpretação reside a sua arte – é marcado pela soul music e o r’n’b. A mesma característica pode ser encontrada em Djavan, para citar um exemplo evidente. Mas o profundo conhecimento do cantor em relação a repertórios como o de seus pais, Ivan Lins e Rita Lee o faz diferente da corrente americana.
Para demarcar o estilo, Pedro relembra os sucessos antigos – como "Pode Ser", de Jorge Vercillo - e novidades, como a música de trabalho "Quase Amor", balada composta especialmente para ele por Vercilo, espécie de amuleto do sucesso, assim como Jair Oliveira (autor de três faixas: a já conhecida "Voz no Ouvido", bem como "Colorida e Bela" e "Memória Falha"), o compositor com quem mais se identifica. Para mostrar que é capaz de flertar com o rock, o cantor grava a inédita "Três Moedas", de Roberto Frejat e Jorge Israel, canção dançante que ele fez questão de transformar em rock. Valendo-se da mesma operação, Pedro covnerteu em salsa o rock "Saúde", de Rita Lee e Roberto de Carvalho. "Sou um intérprete que gosta de enxergar de forma diferente composições consagrdas", diz. "Rita, por exemplo, sempre tem uma levada de salsa, que a gente não nota na primeira vez. Mas você pode reparar que os ritmos latinos estão sempre rondando o rock de Rita, por influência do Roberto de Carvalho, que se nutriu no som latino".
Uma das atrações do disco é o tributo que Pedro faz a sua mãe, com canções que ela lançou, como "Como Nossos Pais", de Belchior, "É com Esse que eu Vou", de Pedro Caetano – com a inédita participação de Sandy, numa rara execução no repertório tradicional - , "Cai Dentro", de Baden Powell e Paulo César Pinheiro (participação de Luciana Mello) e a já falada "Ladeira da Preguiça".
. "Sou um conhecedor profundo do repertório de Elis", revela. "Mas procuro manter uma distância saudável. Mesmo porque não quero ter mais influência do que já tive". Ele explica que há canções que sua mãe pôs em evidência, tipo "Como Nossos Pais", não trazem a essência da cantora. Pedro guarda distância e muitas diferenças , a começar pela tessitura. Enquanto Elis era mezzo-soprano, Pedro é tenor e alcança três oitavas. "Ela cantava uma quarta aumentada acima de mim e fazia respirações e fraseados que pertenciam a ela e são inimitáveis. Eu tento dar a minha contribuição".
Ao Vivo vai resultar em shows pelo Brasil e, se tudo der certo, em turnês pela Europa e Estados Unidos. Segundo o artista, é um trabalho que sintetiza a carreira e encontra uma linguagem. "Quem quiser procurar vai encontrar. Quem quiser ouvir, vai curtir"
Viva a interpretação!


Luís Antônio Giron

Boulez para muitos


Raramente a obra do compositor e maestro francês Pierre Boulez chega ao Brasil. Uma dos papas da vanguarda do fim do século XX, ele rege obras suas – Le Marteau Sans Maître (1955) e Dérive I e II (1984-2002) – à frente do Ensemble Intercontemporain. Sob sua batuta, a Orquestra Sinfônica de Chicago e os pianistas Krystian Zimerman, Leif Ove Andnes e Heène Grimaud (a diva atual das teclas), dão nova leitura aos três concertos para piano de Bèla Bartók (1881-1945). Música pura, complexa e maravilhosa.
Boulez conducts Boulez/ Bartók, The Piano Concertos, Pierre Boulez, Deutsche Grammophon

Judas Priest conta-ataca


A cidade inglesa de Birmingham não é só famosa por sua orquestra. Ela foi berço, em 1974, de uma bandas modelar do heavy metal: Judas Priest. O quinteto, liderado pelo letrista Rob Halford, criou um estilo peculiar, com vocais agressivos e ataque de guitarras em uníssono. Resultado: um som poderoso, a ser conferido nesta caixa com quatro CDs e um DVD que mostram execuções da banda de sua fundação aos encontros anuais de hoje. Constaam das 65 faixas inéditas. A edição vem com um encarte repleto de fotos e um ensaio sobre a trajetória desses sacerdotes do metal puro.
Metalogy, Judas Priest, Sony Music
Luís Antônio Giron

Hooker em face oculta



O cantor e compositor John Lee Hooker (1917-2001) influenciou o blues e o rock’n’roll com sua voz rascante, acompanhando-se por um violão primitivista. Apesar da aparência rude, a música de Hooker sintetiza um século de música popular do Mississippi, estado onde nasceu. Hooker ainda não era famoso em 1949, quando passou uma noite tocando na varanda da casa de um amigo, em Detroit. Esse amigo, Gene Deitch, gravou tudo num aparelho caseiro. Mudou-se para Praga nos anos 50 e só recentemente se lembrou dessas sessões, agora restauradas e digitalizadas. São 28 músicas, entremeadas por comentários, algumas delas sem título. Hooker canta com voz mais impostada gospels e canções folclóricas, além do gênero que o consagrou, blues.
Jack O’Diamonds, John Lee Hooker, ST2
Luís Antônio Giron

Foo Fighters arquivam o grunge


No rock, há exemplos de bateristas que fundam grupos para em seguida dar o fora. É um vaivém determinante. Ele se deu com o Nirvana e calhou a Dave Grohl ser o quinto e definitivo baterista da banda de Seattle. Se no início se mostrava inseguro, hoje ele comanda o festejado quarteto Foo Fighters. Para comemorar dez anos de carreira, o grupo lança o álbum duplo In Your Honor. Grohl canta, toca vários instrumentos e assina as 20 canções do trabalho. O álbum se divide em duas partes: o primeiro CD traz rocks elétricos pesados; o segundo compreende canções lentas acústicas. "São dois discos distintos", diz Grohl. "Nunca fomos tão suaves nem tão agressivos. Para isso, cortamos o caminho do meio".
O balanço sempre hesitante entre a fúria e a suavidade, ruído e melodia, marcou o grunge, estilo capitaneado pelo Nirvana. Grohl permaneceu cinco dos sete anos da banda. Em 1990, ao ingressar no trio de Kurt Cobain (1967-1994) e do baixista Krist Novoselic (1965), Grohl compôs a canção "Friend of a Friend". Usando a marcha cromática típica do grunge, Grohl, com 21 anos, descrevia o modo de Cobain tocar, em um quarto trancado. "Ele nunca amou/ Mas sabia o que era o amor/ Ele dizia ‘não importa’/ E ninguém falava/ Quando ele tocava".
Grohl lançou a música naquele ano e nunca emplacou suas canções no Nirvana. Batizou de Foo Fighters o seu projeto pessoal. O suicídio de Cobain, porém, levou-o a assumir a própria voz. Mesmo sem lembrar Nirvana, Foo Fighters participou da guerra entre som e ruído. Grohl tem razão em considerar In Your Honor seu ápice. Entre as surpresas do disco - participações da cantora Norah Jones e uma bossa nova e do baixista John Paul Jones, ex-Led Zepelin, em duas faixas-, Grohl revisa o passado incluindo "Friend of a Friend". A obra-prima do Foo Fighters resolve o conflito instaurado pelo grunge, por um acordo de paz: cada qual em seu galho, ruído e som. A linha divisória se encontra no jogo de ausência e presença da bateria. In Your Honor define e arquiva o grunge.
Luís Antônio Giron

Vivendo o melhor dos mundos


Em seu sexto CD, Signo de Ar, o carioca Jorge Vercilo curte a condição de celebridade batalhada e se diz realizado




O destino do cantor, compositor e violonista carioca Jorge Vercilo, de 34 anos, é dos mais interessantes nos seus onze anos de carreira. Isso porque ele virou uma celebridade musical que não nasceu da vontade de alguma gravadora de apostar no seu talento. Era um independente fazedor de sucessos cercado por astros de grandes gravadoras. Hoje, quando lança o seu sexto álbum, o superproduzido Signo de Ar por uma major, EMI, Vercilo é praticamente um superastro de grande gravadora cercado de grandes figuras da MPB que se bandearam para os selos alternativos e a música independente. Seus cinco álbuns anteriores venderam perto de 600 mil cópias. Um número impressionante nos anos em que o mercado da música sofreu uma implosão violenta.
Mas a conquista não embriaga esse libriano (signo de ar) que se diz sempre disposto a recomeçar, mesmo ao preço de uma retirada estratégica, como fez no ano passado, para se dar um tempo para produzir Signo de AR.
"Batalhei meu lugar", orgulha-se. "E sei que, se tiver de voltar a ser independente, saberei como fazê-lo com a mesma alegria e entusiasmo". Lembra que conquistou o mercado das bordas para o centro, primeiro no Ceará e em Pernambuco, para só depois chegar no eixo Rio-São Paulo. "O segredo do sucesso é começar da periferia e se afirmar quando você já tem um público", ensina. "Não adianta querer estourar na hora. Você precisa de uma base sólida de público."
Vercilo atribuiu à pirataria e à internet uma transformação do mercado que, até certo ponto, foi positiva. "O jabá deixou de ser uma instituição ilícita", diz. "Hoje uma emissora de rádio não aceita dinheiro para tocar uma música que sabe que não vai faze sucesso. Aquilo que se chamava jabá virou um contrato profissional, assinado e documentado." E se a música for boa segundo os padrões vigentes, argumenta, pode tocar sem ajuda de promoção. "Sempre lutei para democratizar o espaço da música. Acho que ajudei nesse processo".
Quando Jorge Luís Sant’Anna Vercilo apareceu, em 1994, causou surpresa por suas canções românticas e sobretudo pela coragem com que se lançou para o estrelato, sem as redes e amparos das majors. Ele próprio bancou a produção de seu primeiro CD, Encontro das Águas, lançado pela Continental. Algumas canções, como a faixa-título, entrou na trilha-sonora da novela Mulheres de Areia. A canção "Praia Nua", influenciada por Djavan, estourou na trilha de outra novela, "Tropicaliente". Oo processo se repetiu no disco seguinte, Em Tudo que é Belo, que gerou hits que tocaram em novelas e foram dando ao músico o status de um talentoso discípulo de Djavan e Stevie Wonder. O caminho independente também criou uma distinção em relação aos suprerastros da época, ainda atrelados às grandes gravadoras. Herói "indie", Vercilo começou a conquistar o estrelato no finalzinho do século passado, com o CD Leve, também independente, agora sem gravadora. O trabalho lhe rendeu a vendagem de 70 mil cópias. A música que fez o disco decolar foi a canção "Final Feliz", na qual Vercilo fazia duetos com ninguém menos que Djavan. O encontro com o ídolo serviu também para que ele ganhasse uma espécie de autonomia artística. Gravou "Beatriz", de Edu Lobo e Chico Buarque, e iniciou parcerias com ídolos menos conhecidos, mas não menos importantes, como Altay Veloso e Aladim, com os quais escreveu a ótima canção "Apesar de Ciganos".
"Meu contato com outros parceiros só fez crescer como tempo", conta. "E acho que a comparação com Djavan está agora superada".
A semelhança ainda os une, mas é impossível negar o talento melódico, a fluência das letras e o irresistível suingue de Vercilo. Ele se afirmou definitivamente como músico, conta, com o CD Elo, de 2002, o primeiro pela EMI. O trabalho vendeu 250.000 cópias e mais uma vez colocou o astro no pódio. Isso lhe permitiu ousar e provar a sua densidade musical num CD basicamente de MPB, intitulado Livre. A música que fez sucesso foi a que mais remetia ao caráter popular de seus discos anteriores: "Monalisa". "Foi quase um disco hermético, se você pensar no ritmo em que eu estava", reconhece o músico. Seu grande consolo foi ter conquistado a crítica. "Até então, os críticos diziam muita besteira a meu respeito", analisa. "A partir de Livre, eles acharam que eu merecia figurar entere os talentos da MPB".
Decidiu dar um tempo, até para não canibalizar a reputação. "Apareci muito em 2002 e 2003 e resolvi parar para compor, até para recompor também a minha vida pessoal. Aprendi nesses meses que o músico precisa exercer o domínio do sucesso. Saber quando voltar e quando parar, saber o que vai para as paradas e o que toca os críticos".
Signo de Ar é uma tomada de consciência, explica. Com duas músicas feitas em parceria com Ana Carolina ("Ultra-leve amor" e "Abismo"), ele pretende conquistar o público roqueiro. "Eu nunca tinha enveredado pelo rock, e com Ana Carolina, tão diferente de mim, ganhei esse impulso". Entre as músicas do CD, destacam-se também "Olhos de Ísis", com melodia fluida e versos bem típicos da imaginação de Vercilo: "Você é filha de Osiris/ pode volatizar/ se transforma em arco-íris; só pra me apaixonar". Os arranjos são vibrantes, contando com guitarras e solos de harmônica à Stevie Wonder, a cargo de Milton Guedes. As dez faixas formam um CD curto, de cerca de 40 minutos, mas absolutamente equilibrado. Revela-se nele a virtude melódica ímpar de Jorge Vercilo.
Revigorado, ei-lo novamente na estrada. Ele parte para turnê nacional e vai lançar até o fim do ano o seu primeiro DVD ao vivo, gravado na estrada. "Hoje as pessoas não se satisfazem mais apenas com o áudio", observa. "Ver o músico cantar é um componente necessário e essencial do trabalho". E não pára por aí: este ano começa a carreira internacionall. Inicia por Portugal e depois ataca a América Latina. Ninguém mais o segura. "Não temo mais nada", anuncia o astro. Os fãs de Norte a Sul que se preparem.
Luís Antônio Giron

Wednesday, June 01, 2005

Dark Horse Years


The Dark Horse Years: 1976-1992, George Harrison, Dark Horse/EMI Quando os Beatles se separaram, em 1970, George (1943-2001) tinha 27 anos incompletos e já vinha engatando a carreira solo. Vieram sucessos, como a balada "My Lord" (acusada de plágio) e o Concerto de Bangladesh, precursor dos mega-eventos humanitários de rock que se seguiriam. Em 1974, Harrison fundou o selo Dark Horse. Morador de Hollywood, conseguiu emplacar várias canções e trilhas para o cinema. Até 1992, produziu seis LPs que resumem o estilo do ex-"fab" (fabulosos, como eram chamados os quatro beatles): maestria na slide guitar, melodias suaves e cheias de referências indus – a começar pelo logo do selo, um cavalo de sete cabeças da mitologia indiana. A luxuosa caixa reúne os seis álbuns remasterizados e inclui um DVD com entrevistas e clipes do músico. A expressão "dark horse" é usada para descrever alguém com talento oculto. É uma boa descrição de George, um grande compositor meio obscurecido pela dupla Lennon & McCartney. Essencial.