Fonotipia

Vou postar aqui comentários de CDs e DVDs musicais. Luís Antônio Giron

Tuesday, October 10, 2006

Zeca Baleiro muito romântico

O músico maranhense lança dois CDs líricos em pólos opostos: um para tocar na rádio e outro mais intelectual, com poemas de Hilda Hilst


Beirando os 40 anos de nascimento e os 20 de carreira, o cantor e compositor Zeca Baleiro já foi chamado de neotropicalista, intelectualizado e até hermético, para não mencionar que cantou com Gal Costa, suas músicas tocaram em novela e foi assim acusado de ser excessivamente popular, ou populista. Esse maranhense nascido José Ribamar e há duas décadas radicado em São Paulo dá risada dos rótulos que lhe põe. E se afirma sentir-se maduro e com coragem para lançar dois CDs simultaneamente, semelhantes em um aspecto e diversos em outros. Eles se parecem por causa das canções românticas que povoam ambos os produtos. Mas se diferenciam pelo tom e o registro: enquanto Baladas do Asfalto e Outros Blues (MZA/Universal) sai por uma grande gravadora e suas 13 faixas se destinam ao ouvinte de rádio, que gosta de boas baladas; o segundo, com um título bastante longo, Ode Descontínua e Remota para Flauta e Oboé inaugura o selo Saravá, do próprio Zeca, e traz dez poemas da escritora paulista Hilda Hilst (1930-2004) cantados por dez vozes importantes da MPB, de Ãngela Maria a Monica Salmaso, passando por Jussara Silveira, Zélia Duncan, Verônica Sabino e a velha amiga e companheira Rita Rilbeiro. Hilda morreu desconsolada porque não conseguiu vender seus livros, pois era considerada hermética pelos críticos. Uma de seus últimos projetos foi com Zeca, para tentar quebrar a casca do hermetismo e chegar ao grande público por meio da música popular.
Desse jeito, Zeca dá uma no cravo e outra na ferradura, apostando ao mesmo tempo no padrão mais comercial e no gênero cult. “Vou agradar assim tanto ao pessoal da universidade como ao da indústria”, brinca Zeca, pouco antes de partir para uma turnê pela França e Portugal, onde lançou Baladas de Asfalto. “Cheguei a um momento na carreia que posso fazer tudo sem prestar contas a ninguém. O que importa é a obra”.
Zeca acha que é um grande desafio lançar um selo independente, que não terá distribuição por multinacional e que se devota apenas a projetos especiais. “Talvez seja esta a saída para levar ao público um pouco daquilo que o artista sente”, diz. “É um modo também de levar adiante velhas idéias que estão à margem do mercado”. Um deles está sendo lançado pelo Saravá em paralelo ao álbum com poemas de Hilda. Trata-se do álbum Cruel, com nada menos que uma dezena de composições inéditas de um dos mestres espirituais de Zeca, o poeta e baladeiro capixaba Sérgio Sampaio (1947-1994). Zeca teve acesso a uma fita que Sampaio gravou em Salvador no início de 1994, meses antes de morrer. “Ele cantou músicas inéditas para enviar a diversos cantores da época, mas acabou que morreu antes e o documento ficou nas mãos da esposa”, conta Zeca. Há já alguns anos, ele tem alimentado a idéia de lançar o disco – primeiro pelo selo Baratos Afins e agora por conta própria. Convidou 20 músicos da cena paulistana para “contracenar” em overdub com a voz e o violão de Sampaio. O título vem da única música que já havia sido gravada, “Cruel”. “O disco póstumo de Sérgio Sampaio vem para ficar”, garante.
Sempre humilde com a própria obra, Zeca não hesita em dizer que produziu Baladas do Asfalto como o produto mais fora do seu controle que jamais fez. “Não sou o produtor, apenas forneci as canções, a partir da idéia dos produtores Walter Costa e Dunga, que me pediram para fazer baladas para rádio”, conta. “Achei ótima a idéia e passei os últimos meses compondo como um doido: de um lado as canções para rádio, de outro finalizando como produtor o CD em parceria com Hilda.” Ele não considera, porém, os projetos em parceria como puramente seus. Discos de carreira mesmo são cinco, incluindo-se Baladas do Asfalto. Em 2003, gravou um belo trabalho com o cantor cearense Raimundo Fagner, mas acha que não pertence à sua pura inspiração.
“Se eu estivesse à frente da produção de Baladas do Asfalto, o resultado sonoro seria diferente”, analisa. “O que não quer dizer que não esteja excelente”. De fato, as 13 faixas são caracterizadas por arranjos de estúdio, capitaneados pelo baixista e produtor Dunga, que tocou com Lulu Santos e outros medalhões da cena pop carioca. A melhor canção do disco também será a música de trabalho: “Alma Nova”, uma parceria de Zeca com o poeta e conterrâneo Fernando Abreu. Há outras colaborações de letristas no CD, como “Versos Perdidos”, com versos de Fausto Nilo e “Flores no Asfalto”, com Gerson da Conceição. “O clima todo é romântico, música de estrada para tocar e acompanhar em coro”. O que não impede que Zeca dê seus pulinhos intelectuais aqui e ali, como na última faixa, “Mulher Amada”, sobre poema de Murilo Mendes, “Relatividade da Mulher Amada”.
Até o fim do ano, Zeca pretende lançar o disco “de rádio” em uma turnê nacional e, para isso, deve montar uma banda. “Conquistei um público cativo no Brasil todo”, alegra-se. “Minha carreira foi construída no boca-a-boca. Nada mais natural que eu trabalhe no corpo-a-corpo, indo onde o público está, do interior do Maranhão ao do Rio Grande do Sul. Tenho certeza que esse público que compra meus discos no shows não vai se decepcionar.” Com certeza, Zeca Baleiro atingiu um ponto em que pode agradar a gregos, troianos, nordestinos e sulistas sem perder a elegância. Acessível ou cult, o fato é que ele continua espalhando gelas canções pelo Brasil.

Luís Antônio Giron

1 Comments:

Blogger ADEMAR AMANCIO said...

Ouvi muito pouco Zeca Baleiro,vou procurar os álbuns.

8:32 AM  

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